quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A moça de cabelo raspado.

Era um domingo qualquer. Desses que após a ressaca moral do sábado anterior, você sai absolutamente sem rumo na avenida principal com seu cigarro na mão direita, desfrutando o deleite de sua pouco promissora juventude.
Era nesse ambiente sem nenhuma importância que eu andava, descompassado, em busca de coisa alguma. Não me importava a hora, contanto que ela passasse rápido e afastasse de mim esse maçante fardo que acompanha as tardes de domingo.
O tempo não estava bom. Exatamente do jeito que eu gosto. Nublado, pouca cor, sinal nenhum de sol. Foi quando meu tênis desamarrou.
Num majestoso e desajeitado gesto, amaldiçoei o destino devido a ocorrência daquele fato trágico com os meus cadarços. Ajeitei o cigarro na boca, e abaixei meus pouco atraentes 1,85 de altura para amarrar aquele tênis gasto, possesso de raiva. E foi justamente aí que ela passou.
Ela, reluzente de encantos, num sorriso estampado descreveu para mim todos os acordes de uma melodia perfeita, que corria com simetria nos seus olhos curiosos e no seu sorriso traiçoeiro.
Numa fração de segundos ela desapareceu da minha frente, na garupa daquela moto, com aquele cara de jaqueta de couro. Coitado de mim, só aquela flanela xadrez velha já apontava em minha direção a flecha do fracasso.
Mas ela, ah, ela era tudo de mais sublime, a minha quimera particular, a personificação dos meus desejos mais íntimos e irrealizáveis. Ela tinha a cabeça raspada dos dois lados, e um sapato pouco convencional, e carregava consigo toda a magia e o mistério feminino que eu jamais ousara tentar desvendar.
Ela me aprisionou abaixado, com os olhos fixos na moto; na moto não, nela, na sua doce magreza, e no seu nariz perfeito. Que nariz! Ela me manteve estático ali no chão, até virar a esquina e sumir para sempre.
Ela sumiu. Num estalo brutal, minha mente voltou a realidade e terminei de amarrar o tênis.
Pensei em correr atrás da moto.
Desisti.
Pensei em sentar ali e ficar chorando feito uma criança.
Desisti.
Pensei em voltar correndo pra casa, desenhar aquele rosto e preparar cartazes para espalhar pela cidade toda.
Desisti.
E também, quem sabe sua aparente personalidade forte não fosse uma farsa? Quem sabe ela não era mais uma dessas moralistas chatas que iria me proibir de beber e fumar no primeiro dia de namoro? Quer saber, deixa pra lá.
Atravessei a rua. Virei a esquina.





E então ela descia da moto, ali, na minha frente. Era minha única chance, a chance de ouro. Ela veio então em minha direção. Sorriu o seu sorriso fatal e sibilou: "Tem isqueiro?"

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Encachorrando-se.


São focinhos. Focinhos gelados, desajeitados, curiosos, agitados. Focinhos cor de rosa, focinhos marrons, focinhos mesclados de amor.
São orelhas. Orelhas pequenas, enormes, levantadas, orelhas que procuram, orelhas para trás. Orelhas atentas, orelhas caninas.
São rabos. Compridos, cortados, de pompom.
São cachorros.
Só quem tem alma de amor consegue compreender a alma de um cão. Cachorro não fala, mas diz. Ele olha, ele lambe, ele diz. Cachorro é a pureza de todas as sensações primitivas que o amor trás embutidas num ser peludo, de quatro patas, as vezes três. Cachorro só tem a imagem denegrida por causa dos equivocados que não conseguem compreender cachorro como essência de vida e de amor, que ele verdadeiramente é, e late sendo, e lambe sendo, e deita sendo.
Cachorro não é só a biologia de cachorro, porque cachorro também é alma, e tem acima de tudo graça de ser quem ele é sendo um cão, simples assim. Porque cachorro não se preocupa com a futilidade, cachorro não quer ficar bonito, e nem cheiroso. Cachorro não quer se vestir bem e nem um colar de diamantes, cachorro quer apenas colo e abanar o rabo quando chegamos em casa. Cachorro não é manipulado pela nossa maldade, então cachorro ama com cada milímetro do seu ser tão fascinante, tão dócil, tão cachorro.
Só quem já conseguiu ler um cão e chegou a conclusão nenhuma sobre sua essência canina consegue ama-lo da forma que eu o amo, porque cão não se lê, não se pensa, cão se sente.
Quando você se senta na escada e não segura o choro, ou quando suas fétidas inquietações de humano tiram-lhe a paz, o cachorro lambe o dedo do seu pé. Quando você não entende mais a vida, e nem a sua condição humana e pensa em sumir, o cachorro te olha com seus olhos de cachorro, tão únicos, tão brilhantes, tão vivos e assim você descobre novamente o porquê de estar ali.
E mesmo quando o cachorro te enche de raiva, por ser tão puro, e você tão humano, ele sabe que sentando-se ao seu lado e apoiando a cabeça tão encachorrada no seu colo, vai te fazer compreender novamente que cachorro só é cachorro porque é puro amor.
Cachorro é, acima de tudo, a prova de que amor para ser amor não precisa ser verbalizado. Cachorro prova que amor é a arte da simplicidade de ser vivo, é a arte de encontrar a felicidade nas pequenas coisas, e nas pequenas lambidas e choramingos para você dividir o chocolate.
Cachorros são seres maravilhosos, que merecem respeito por manter dentro de cada um de nós a certeza de que o mundo poderia ser bem melhor se usássemos o amor como nosso meio de sobrevivência. Porque cachorro só vive porque ama e vive para amar.
Cachorro é amor.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Texto Desconexo.

Eu não gosto. Deixo de gostar mais do que aprendo a faze-lo com as pessoas, as coisas, as formas, e tudo. Estou cada vez mais à espreita do meu surto existencial, devido a minha inconsequente maneira de ser e de agir segundo meus sentimentos momentâneos, que não abrem brechas para a minha liberdade de espírito.
De tanto querer me desapegar, acabei fazendo de mim a vítima do jogo que eu mesma inventei de conquistar e reconquistar as pessoas próximas, descobrindo só depois que o valor do que se sente não pode-se ser medido em palavras ou em ações. Nunca quis ser presa à alguém e me prendi à todos sem perceber o ato.
Eu tenho em mim essa maneira abstrata de entendimento, que não consegue acompanhar as linhas da minha fala, e então exprimem seus sentidos através das minhas mãos, do que escrevo e consigo descrever. Eu sou a minha grande incógnita, portanto todos à minha volta são um emaranhado sublime de falta de sentido, que constroem em mim essa angústia encantadora pelo majestoso espetáculo de ser.
Não gosto de pensar em individualidade e nem em padronização. Não me permito limites, e mesmo assim tento faze-lo por teima pessoal. Desisti de tentar compreender meus próprios pensamentos, e resolvi coloca-los em papel, afim de organizar minha mente e tentar por entre os anos construir uma linha sólida que explique a maneira que meus pensamentos funcionam, e o porque eles são tão desconexos, se nem tenho tanta carga etária a carregar.
Sou um paradoxo e me contradigo com a mesma frequência que respiro. Costumo manter uma distância significativa dos meus atos para minhas palavras e das palavras para a minha mente.
Alimento a paixão pela humanidade e pelos seus grandes nomes, e pela sua história hostil, ao mesmo tempo que me enojo dos homens e de ser parte viva do meio humano. Crio em mim esse desgosto por ser parte integrante da maior das doenças da terra, que é tão destruidora quanto criadora. Que quer entender o que não se pode, e então cria espetáculos indescritíveis com suas conclusões mal acabadas. Que ao mesmo tempo que tenta compreender e desenvolver a todo instante parte da ferramenta da razão, destrói todo equilíbrio de um sistema perfeito regrado por instinto e natureza.
Aonde querem chegar os homens?! O mais vulnerável dos animais, que para suprir sua vulnerabilidade aprendeu a pensar, e agir de acordo com a razão, não mais com os instintos de sobrevivência. Passou da razão à falta de sentido, pois não há razão que desvende tudo, e não há cérebro humano capaz de configurar a total compreensão do tudo. O mundo continua seguindo seu rumo infinito, e a humanidade se torna cada vez mais parte insolúvel do quebra cabeças magnífico que é a Terra.
Sou parte de tudo, e me sinto nada. Qual é a importância? Dentro de tudo, sou só mais uma peça confusa da humanidade que se põe em confusão a todo instante, devido sua superioridade perante os outros animais. Superioridade de que?
Eu não sei. Grande ilusão dos apaixonados a breve história que resume a vida e a condição humana. Não me simplifico, não simplifico a existência, apenas edifico nela a constante dúvida poética das minhas angústias mais intimas sobre quem sou e quem somos todos nós, procurando e procurando a resposta até os confins da minha carne.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

O inexplicável.

É um misto de sentimentos opostos, conjuntos, embaralhados, entrelaçados por veias e artérias centímetro a centímetro do seu corpo. Seu corpo que quer despir-se de razão e de vestes e que se encharca de suor ao encontrar o corpo próximo.
Corpo amado, de linhas sutilmente desenhadas para o contorno de suas mãos e seus lábios da forma mais sublime e áspera, como se aquilo jamais pudesse ser explicado com números, palavras ou vocábulos mundanos.
De suas entranhas brota-se o prazer. De sua boca vem o suspiro, e o gemido, e a dor da alma resplandece nos seus olhos da forma mais doce e delicada possível, a fim de colocar teus sentimentos sutilmente a mostra para quem quiser saber.
O amor é a dor da alma, o prazer do corpo, a tortura da mente, o desejo do outro desesperadamente a ponto de perder o juízo e não saber falar e fazer com a razão.
Amor é maior do que tua casa, maior que tuas palavras ou linhas desenhadas tortas num pedaço de papel. Vai além das cartas e dos múrmurios, além da verdade escrita nos papeis, além de tuas vestes e do teu corpo, dentro de ti e mais profundo.
E com os desencontros, e com os encontros, e com as entradas e saídas rítmicas vem a dor da falta e o soluço da saudade. A fera do ciúme e seus monstros de pecado.
Sua ferocidade possessiva põe em pratos limpos a sujeira e cospe em cima daquilo que antes fora bonito, a dor te enche os olhos de lágrimas a cada anoitecer.
Quando perde-se o amor, sente-se esquecido, ínfimo. Amor é um riso de sarcasmo e de orgia. Amor é o mais desastroso dos sentimentos depois de sua partida, o mais impactante com a chegada e o menos racional. O inexplicável.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Desabafando meus doces.


Este será um post de desabafo pessoal.
Eu estava prestando atenção nas pessoas. Eu estava prestando atenção em mim mesma, e então eu descobri como a vida vai de mares de emoções densas, a desertos de futilidade.
As pessoas querem o tempo todo, ou a maior parte do tempo, desperdiçar o seu próprio tempo de vida, tão rápido e tão fugaz, partindo de filosofias tão infundadas. Um grande exemplo disso é como nós nos tornamos robôs diante do padrão de beleza imposto pela imprensa e pela nossa própria mente enganadora. Todos querem
ser altos e magros, como é exposto nas revistas, como as pessoas ricas e legais aparecem na televisão.
Isso não é legal. Não é legal uma pessoa se diminuir diante desse tipo de situação, mas é exatamente o que acontece, principalmente comigo. Eu não tenho tempo para perceber as minhas qualidades, devido ao tanto de tempo que desperdiço pensando que sou menos que os outros, porque não sou tão bonita quanto a maior parte das pessoas. É uma questão mesmo de se sentir inferior.
Eu, sempre tão defensora da liberdade religiosa e sexual, tão criadora de filosofias e teorias particulares, não consegui ser suficientemente capaz de me desapegar da massa nesse assunto tão fútil e tão sem sentido. Afinal, porque é bonito ser magro? Porque eu nasci dentro dessa imposição? Eu sei que na verdade está mais para uma jogada de marketing, do que qualquer outra coisa. A opressão sobre os gordinhos e baixinhos se faz tão intensa que você tem mais vontade de comer, e gastar comprando roupas pra ver se alguma coisa finalmente irá te cai bem e assim você se sentirá melhor. O que todos sabem que, na teoria é papo furado, mas na prática acontece desse jeitinho.
Eu já estudei e fiz vários ensaios sobre o que é ser gordinho, mas por um motivo desconhecido, ainda tenho esse paradigma estagnado na minha mente, e para mim mesma, eu nunca serei bonita.
Em diversos pontos da história a imagem da mulher perfeita era a imagem da mulher gordinha. Mas isso já passou, e agora eu vejo magrinhas por todo lado me sentindo a sobra da sociedade por não ser bonita. E agora, o que fazer?
Faço minhas caminhadas, tento controlar o que eu como. Mas quando o resultado demora demais eu logo desisto, porque não há nada melhor do que comer, e isso se torna um ciclo vicioso que me deixa presa aos meus pensamentos depressivos e minha auto estima baixa.
Ao contrário de mim, conheço muitas pessoas gordinhas que se dão muito bem com o fato de serem gordinhas, e por isso parecem até mais bonitas que as outras pessoas. Parabenizo as pessoas que conseguem lidar com essa situação com maestria, porque não há nada mais bonito do que ver uma pessoa a vontade consigo mesma sendo quem ela é, e não acanhada por não ser como as mocinhas magrelinhas dentro do padrão de beleza.
Enquanto isso, enquanto as pessoas sabem lidar com seus problemas, eu fico aqui brincando de aprender a viver, sempre tropeçando na mesma pedra, e sem forças para tirá-la do caminho. É um problema e tanto.
Mas tudo bem, porque segunda, eu começo um regime.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Scrībere.


Estou frustrada.
A frustração é gigantesca, do tamanho de um véu infinito que cobre todas as vertentes da beleza

do ser. Frustração dolorosa, pungente, fatídica. Sinto como se meu coração estivesse preso e prestes a explodir, devido a pressão exercida pelos vorazes dedos de vazio.
Os dedos que seguram e quase sufocam meu coração em batida arrítmicas não podem ser visto. Ninguém os vê, todos os sentem, mas de maneiras diferentes, e por vezes quase antagônicas.
As pessoas que sabem, essas transformam. As pessoas que usam da ignorância diante a dor, frustram-se.
Frustração não tem motivo certo, nem porquê preciso, mas tem dor, e agonia. Bebe água, e não gosta. Bebe vida, e não quer. Bebe ser, e não é. A agonia da frustração cessa, ela para e acalma no ventre do encantamento. Encantamento é finito, e então a frustração volta. É um ciclo vicioso, é negativo.
Frustração não é doença, mas tem remédio. Uso do meu enquanto posso, enquanto meu modo de remediar consegue usufruir do poder de anular a força da minha agonia frustrada. Então eu luto contra o vazio que prende minha alma, que prende minha vontade, que prende todo meu encantamento, luto contra os dedos acorrentados à minha percepção e, de maneira quase arcaica, coloco para fora.
Eu escrevo. Letra a letra, palavra a palavra, frase a frase, minha alma se faz viva através da escrita. Limpa a alma, lava o medo, lava a frustração. Das pontas dos dedos nasce a luz, e a escrita se transmuta-se para mais do que o que é apenas. Escrita é benção, é preciosíssimo. A escrita, as palavras, tornam-se os trilhos que levam a alma a outro patamar do ser.
Meu modo é escrevendo, meu modo é juntando pequenos símbolos que expressam tudo o que não me transpassa as cordas vocais e nem as vertentes do corpo. Escrever é o que me faz ser.
As mãos não são como a alma, e nem chegam perto, mas são parte, são um pedaço componente fundamental. E mesmo que elas não acompanhem, e não saibam exatamente aquilo que o ser diz, elas correm, velozes, ininterruptas, beirando a exaustão para buscar a essência de sua integração íntima com a alma.
Escrever remedia frustração, escrever é como a dança de quem o faz, é como arte de quem a sente, é como música de quem a compõe. Escrita é arte e é razão, escrita é a bagunça dos fragmentos da mente encontrando-se com a alma. A mente não acompanha, e não acha as palavras, mas ela continua correndo, continua integrando-se e tornando-se uma com a alma. E a mão.
Escrever é mais do que escrever, é sentir, é ouvir, é amor. Escrever é o que me faz viva e o que me afasta do que eu temo. E o que me aproxima também. Não escrevo porque querem, não escrevo porque gostam, escrevo porque sou.
A mente diz, as mãos fazem, a alma é.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Tic-tac.

Quem sabe do tempo? Das decisões que o mesmo toma?

O tempo está sempre fazendo suas façanhas, transformando o sentido das coisas, situando-nos
num caos psíquico, onde nosso corpo não acompanha o sentido da nossa mente, e nem do meio externo
O tempo propõe-nos seu jogo cheio de blefes e cartadas frias e imprevisíveis. O tempo irá partir nossos corações, sem que ninguém preveja o ato majestoso.
E ai de mim que tenho esse modo fraco de encarar a realidade, de sentir e tentar decifrar cada emoção sútil. O tempo gosta de me apontar sua arma destruidora e me afastar aos poucos de cada laço cheio de amor que eu crio; porém, todos sabem que o tempo sabe ser menos cruel a cada vez que, determinado, vai em busca de curar o que tivera corrompido e machucado, reinventando nossas mentes e criando nossos parques de diversão particulares dentro delas.
Quem terá o poder de prender o tempo?! Quem terá o poder de modifica-lo e transforma-lo naquilo que sua mente mandar?! E de que vale o decorrer dos fatos sem a incerteza cortante do tempo por entre os segundos e os séculos?
Todos são estranhos perante o tempo. Desde que o relógio do universo começou a correr, o tempo é apenas a dimensão indefinida que dita os rumos do que é vivo, e o que afeta a percepção humana sobre o que é e o que deixa de ser.
O tempo é um artista que proclama sua obra através de cada alma sofrida e de cada coração partido, de cada momento de alegria e excitação, com a destreza de mestre de não se fazer notar. O tempo decidiu que o que seria, e então o fez com maestria. O tempo decidiu que afetaria toda e qualquer forma de ser, e tem o feito, com esse sorriso leviano, do ladrão misterioso que aparece sem que se note, e rouba tudo sem deixar vestígios.
O tempo tem dito e feito, e tem cumprido e acertado, e seguido seu próprio rumo, imune de qualquer interferência humana. O tempo se faz de Deus. Mas quem mesmo sabe o que o tempo é?

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Inverossímil eu.

Estou passando por um período de auto conhecimento, que tem me afetado diretamente em toda prática da minha vivência. Tenho vivido como se já estivesse para morrer, e morrendo aos poucos com a minha falta de vida.
É um processo longo e doloroso esse, de conhecimento do seu próprio ser, você sente tantas interferências externas que acaba se esquecendo que isso é a realidade e não apenas mais um sonho fugaz da sua mente quase insana. É tudo tão abstrato, e tão impalpável que chega a doer a falta de solidez.
Me sinto antagônica em minha forma, vendo provir de minhas veias uma fraqueza sórdida, e ao seu lado, uma força voraz e lenta, muito lenta.
Eu consigo me ver no espelho da alma e acompanhar todas as minhas mutações, e entender todas as minhas vertentes, vendo-me a musa da minha própria vivência e um papel em branco disposto a ser escrito e renovado dia após dia. Contraditoriamente, vejo-me suja, conturbada, manipulada; meus feitos parecem vazios, minhas vontades me parecem infundadas, minha beleza de espírito parece corrompida toda vez que tento abrir minha boca.
Não entendo, e me disponho a pensar, chegando a conclusões extremadas sobre quem eu sou, e desmentindo-as pelas minhas próprias ações, chegando ao cúmulo da despersonalização do eu, e me enxergando de cima, pelo panorama de quem saiu e apenas observa, de quem está mas não está. Eu não estou me sentindo, mas ainda estou viva. Overdose de pensamento, overdose do pensar; mente que glorifica o homem e que o embreaga com sua forma furtiva de agir, de manipular o seu próprio dono; mente contraditória, alma relapsa, combatentes de uma luta sem fim em busca da essência do tudo; culpadas da minha insanidade mas também minha panacéia.
Busco de maneira ininterrupta os adjetivos que me compõe, para transcrever minha essência, e mostrar-me forte, mostrar-me digna, apresentar o meu eu para que todos o contemplem em sua forma natural, livre de julgamentos e acusações. Quero conhecer o tudo que há em mim, e é exatamente por esse caminho que me encontro sendo nada.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A liberdade de não ser.

Você acha engraçada a forma como as pessoas tem dado risada, mas não tem graça sorrir só para fechar os olhos e fingir que tudo está bem, que tudo ficará bem, que as coisas estão todas em seus devidos lugares, quando elas estão uma bagunça, e absolutamente ninguém se dispõe a resolver.
É bom enquanto ainda não dói, é bom enquanto não foi com você. Até quando não será? Você tem feito isso pensando que durará pra sempre. Você não segue, porque morre, e são seus próprios erros que te matam pela sua própria boca e pela sua vontade de passar pela vida sem realmente saber o que é viver. Você está somente sobrevivendo, e nem enxergou isso ainda, porque se sente pleno, do vazio, da falta, do que as pessoas tem dito que te dá prazer.
Você tem dado risadas trovejantes na cara de quem diz não, você tem achado que sua liberdade está na felicidade de ser igual. Você tem sentido o vazio, mas você o compra com presentinhos baratos, e consegue então se sentir pleno novamente, de nada.
Você tem se esquecido de ouvir os pássaros, tem esquecido de olhar o céu, você não se lembra mais de como é o gosto da maçã, e nem o que é pisar na terra. Você Tem vivido no concreto, no seguro, você tem vivido com o próprio medo inibido, você se tornou uma máquina que não ouve e se nega a ver.
Seus olhos se fecharam, tem um certo tempo, para qualquer coisa que está abstrata a sua realidade pequena, você não enxerga mais o caos, você não quer ver, porque está feliz na sua plenitude branca, e excitado em não sentir absolutamente nada.
Onde estão essas vozes? Você quer saber onde elas estão, mas você não quer senti-las, e então para em frente seu próprio eu e fica. Estabiliza-se diante dos gritos, e segue pelo caminho oposto, como se absolutamente nada estivesse acontecendo na vizinhança. Não é importante, não é real, não é sua pele, não são seus ossos, você não precisa enxergar, porque você não quer ver, e você aprendeu assim, e é assim que vai ser.
Suas reclamações são tão fundadas, não é mesmo? Seu desespero por aquilo que te faz ser o que você não é, sua atração magnética para aquilo que você vê e enche os olhos, sua vontade impulsiva e “racional” de querer aquilo que você ainda não conseguiu. Mas ah, eles falam, eles falam que eu tenho que conseguir, como poderei eu viver sem ti, grande amontoado de coisas que compõe meu eu? Como poderei eu encara-los se não os tiver, como poderei eu dizer que sou digno se não me dignifico com tua presença, felicidade empacotada?
Você não quer aderir aquilo que te faz pensar, você não quer aderir aquilo que te faz sentir, você não quer aquilo que te faz ser. Você vem tendo essas ilusões lúcidas, mas quem se dispõe a te acordar? Você quer acordar? Você quer sanar?
Você está com medo. Medo do medo. Medo de ter que encarar, está com medo de que sua casa encha-se de terra, e está com medo de despentear os seus cabelos. Está com medo de não encontrar seu príncipe, está com medo de abrir os olhos e não encontra-la, mesmo a vendo, porque assim como você ela não é.
Você é livre. Até onde você quer ser, até onde você se deixa querer, até onde seu querer te deixa não pensar.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Covardia Infortúnia.


Tenho tido medo. Não o medo abstrato por onde correm as vertentes humanas, mas o medo personificado daquilo que já se concretizou e ainda me recuso a acreditar. Tenho fugido do destino e dos fatos, encontrando aconchego na falsa calmaria do meu ser que se recusa a acreditar naquilo que está disposto à ferir.
Desacredito minhas fraquezas e meus medos, e tenho os feito ínfimos perante minha vontade de não encara-los, mas ainda sim sinto-os à espreita de um reaparecer imprevisto. Meus medos me ferem, mas recuso-me a olhar a ferida e busco outros rumos para esvair a minha dor.
O medo da solidão sempre se fez uma constante por entre o passar de meus dias, sempre me assombrou sutilmente com suas peripécias escarninhas. Agora meu medo dorme, mas não está mais sob sua forma primordial indefinida. Meu medo tem forma e cor, e não obstante continua a crescer em seu sono a cada dia que passa, pronto para acordar e verter em mim sua impetuosa fome. Meu eu ainda é fraco e não se porta da maneira correta, se perde em palavras por muito pouco, e ainda não é insolente o suficiente para se rebelar contra seus monstros.
Vejo-me a beira de um abismo, onde tudo que já tivera passado está disposto à me fazer cair. Tudo aqui é inseguro, escorregadio, o ar tem cheiro de desconfiança, o coração reluta em aceitar o ambiente.
As lembranças ecoam-me na mente como gritos de quem quer voltar, de quem quer ser revivido, reaproveitado, e então açoitam-me com sua fibra de aço me fazendo recordar que aquilo que não tivera sido feito anteriormente, não poderá ser corrigido jamais, por desacerto cruel do destino que se pôs a trabalhar contra mim.
Disse, petulante, para meu eu: "Não chores, não faça-te pequeno e oprimido. Relute."... Mas coitada de mim, sou dessas que tem vontade de segurar tudo com as mãos e carregar o peso do mundo, mas não consegue nem dar um fim justo à seu próprio sofrimento sem ter que fingir não vê o quanto dói a distância, o quanto dói assistir de perto o adeus impiedoso que o passado sussurra ao longo das milhas e das horas.
Quisera eu ser fonte do puro remédio para as dores dos fracos, mas fraca também sou. Quisera eu encontrar a quimera dos sonhadores apaixonados, mas a desilusão há tempos vem pedindo entrada ma minha alma pela porta principal. Quisera eu ser a cura da saudade, quisera eu matar a saudade, mas desse tamanho não poderia ser.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Morte.

Busquei os rumos corretos para achar um bom título para minha próxima prosa, mas nenhum teria se encaixado tão bem quanto a nua e crua palavra morte. Esse texto foi escrito num momento de inquietação da minha alma, e portanto, até poucos segundos não tinha título definido. Há pouco menos de um mês, encarei a morte de um ângulo que nunca tivera encarado antes, quando o melhor amigo do meu primo morreu tão jovem de uma forma absurdamente inquietante. Minha mente ficou um tanto quanto indignada com os rumos trágicos que a vida pode tomar e então discorri toda minha intriga pessoal no texto que segue:

O fim da vida é um tema um tanto quanto solidário com os grandes autores e
poetas, e também para os singelos que amarelam suas grandes obras dentro da terceira gaveta do balcão da sala. O que existe de tão inspirador num fato tão trágico é uma incógnita tão complexa quanto a própria vivência.
A vida. A morte. Dois opostos. Limitam-se um pela existência do outro e trabalham em perfeita harmonia. A morte, mais travessa e mais sombria, corrompe o show da vida num golpe de mestre, a aprisiona com chave de ouro para que todos possam assistir seu show se lembrando daquilo que a vida fora da maneira mais bela possível.
Você tão humano, limita suas fraquezas à duas oras na academia, e sua força à dois maços de cigarro. Você dedica sua vida ao celibato, ou aos deuses espalhados pelo mundo. Você namora, cria seus filhos, faz amigos, viaja o mundo, tenta entender, tenta explicar, tenta compreender o porquê das coisas e o porquê do seu salário tão baixo e então você morre. Ora, que devaneio do destino ser tão trágico no seu desfecho, que castigo mais cruel nossas forças divinas impuseram sobre nossa sorte. Que falta de sorte.
A morte é interpretada, prejulgada, exposta, indiciada, mas a pobre jamais fora compreendida, pois a vida nasceu antes e foi a morte que apareceu por ali para tomar seu lugar.
Mas e o amor? A esperança? E todo o abstrato cheio de significado que pinta o quadro de quem tem vida? Para onde vão? Quem fica? O que sobra? E agora? Agora acabou, dona vida. É a hora que você fecha a cortina, pega o seu chapéu e vai fazer seu espetáculo pra ninguém. Toda morte sabe a hora que deve entrar, toda vida dá espaço para que ela venha entrar, mesmo que o show da morte ninguém queira ver.
Faz parte do show da vida de cada um a morte daquele por quem o amor nasce, cresce, floresce. Faz parte da vida a dor de quem vai e a lágrima que fica. Fazem parte os beijos, as músicas de domingo, os abraços no meio do filme, o por do sol na beira do mar, as brigas injustificadas, os sorrisos abertos, a saudade do cheio e o vazio da falta. Faz parte da vida seguir fluindo quando a morte de quem se ama teima em chegar. Faz parte de tudo aquilo que é vivo, deixar de ser.



terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Desexplicando a juventude.

Deslocada, a juventude flui por entre os anos criando, inovando, renovando e imortalizando o abstrato do que é jovem.
Jovem não é mais o conceito pré moldado de juventude e adolescência, porque o jovem perdeu a idade e ainda se aventura aos 75. O jovem se entrega à tudo, portanto juventude deveria transcender seu vocabulário e seu valor etário, se fixando como estado de espírito, espírito de quem se doa à própria essência humana, de quem a consciência ainda se fixa na falta de sentido do ser e da vida.
E afinal, por intermédio de que a juventude se torna o que é? Ora, a juventude não é. Por mais que se queira encontrar um conceito universal do que é a juventude, existe uma barreira que que impede a explicação do jovem, pois o jovem é e deixa de ser a cada segundo, a cada metro, a cada pensamento. Quem é jovem desentende tudo que já tivera entendido antes à cada informação recebida, desentende entendendo, entende desentendendo, aprende, cria, ama, e então para de amar.
Jovem é o sentido contra a corrente das coisas, é a paixão pelo que não se é entendido e a constante vontade de estar pleno de ser.